Com trajetória marcada por atuações diplomáticas em cenários de tensão internacional, o Brasil busca reafirmar sua vocação como mediador nos conflitos da guerra na Ucrânia e da crise no Oriente Médio, mesmo diante dos desafios geopolíticos atuais
Desde o início do século XX, o Brasil consolidou uma reputação de mediador em conflitos internacionais, ancorado em sua política externa pacifista e no princípio do multilateralismo. Do papel pioneiro no Pacto de Bogotá (1948), que buscou promover a resolução pacífica de disputas na América Latina, à participação ativa em missões de paz da ONU, como no Haiti e em Angola, a diplomacia brasileira frequentemente se apresenta como uma ponte em cenários de tensão.
Nos últimos anos, porém, o contexto global se tornou mais desafiador. Com a guerra na Ucrânia e a escalada de violência no Oriente Médio, o Brasil tenta reafirmar sua tradição diplomática, mas enfrenta dilemas próprios de um mundo multipolarizado.
O caso da Ucrânia
Desde o início do conflito, em fevereiro de 2022, o Brasil manteve uma postura cautelosa, evitando alianças diretas com qualquer uma das potências envolvidas. Embora condene a invasão russa no âmbito das Nações Unidas, o governo brasileiro também advoga pela necessidade de diálogo, reconhecendo os interesses de segurança da Rússia e a soberania ucraniana.
Com o atual governo, essa abordagem ganhou destaque. Durante cúpulas internacionais, o presidente Lula criticou a falta de esforços de negociação por parte das grandes potências, ao mesmo tempo em que propôs um grupo de países neutros para mediar um cessar-fogo. A iniciativa foi bem recebida por alguns setores, mas também gerou críticas por ser vista como ambígua diante da gravidade do conflito.
Crise no Oriente Médio
A retomada da violência entre Israel e o Hamas em 2023 reacendeu outra frente de atuação diplomática. Como presidente rotativo do Conselho de Segurança da ONU em outubro daquele ano, o Brasil articulou esforços para a aprovação de uma resolução que pedia um cessar-fogo humanitário. Apesar do veto dos Estados Unidos, a iniciativa evidenciou a tentativa brasileira de ocupar um espaço proativo em fóruns multilaterais.
Além disso, o Brasil, com sua vasta comunidade árabe-palestina e uma significativa população judaica, carrega um simbolismo único. Essa diversidade cultural reforça o apelo do país como uma voz legítima e equilibrada em questões do Oriente Médio, embora também exija uma gestão cuidadosa para evitar tensões internas.
Desafios e potencial
O papel do Brasil como mediador é frequentemente limitado por fatores estruturais, como a ausência de um poder militar ou econômico proporcional às grandes potências. Contudo, é justamente essa condição de ator neutro que reforça sua credibilidade em muitos cenários. O desafio, hoje, reside na capacidade de traduzir essa reputação histórica em ações eficazes em um mundo profundamente polarizado.
A aposta no multilateralismo, somada à defesa de reformas em instituições globais como a ONU, reflete a visão de que o Brasil pode atuar como um moderador relevante no cenário internacional. No entanto, sua capacidade de influenciar depende também de alianças estratégicas e de sua habilidade em manter uma postura equilibrada, mas assertiva.
Em um mundo marcado por conflitos cada vez mais complexos, o Brasil segue como um exemplo de que diálogo e diplomacia ainda podem ser ferramentas importantes de transformação. Resta saber se, diante dos desafios contemporâneos, o país conseguirá sustentar essa tradição e moldar um papel de liderança em prol da paz global.
Texto: Arnaldo F. Vieira – Ascom Subseção/SP
Revisão: Tamires Lopes – Ascom FRB
Imagem: Internet