A urbanização acelerada e desigual das grandes cidades brasileiras aliada à herança escravista do país criou um dos maiores e mais complexos problemas sociais do Brasil, no qual as favelas se tornaram componentes visíveis e, ao mesmo tempo, marginalizadas da vida urbana.
Segundo uma prévia dos dados do Censo Demográfico de 2022, divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística – IBGE, o Brasil tem mais de 11 mil favelas, onde vivem cerca de 16 milhões de brasileiros. Um aumento de cerca de 40% no número de brasileiros morando em favelas nos últimos 12 anos.
O historiador brasileiro Sidney Chaloub, em seu livro “Cidade Febril”, descreve alguns aspectos do fato social que deram origem às favelas como conhecemos na atualidade.
Os cortiços, como eram chamadas as habitações coletivas de baixo padrão que surgiram como solução informal para a moradia de pessoas de baixa renda, foram o alicerce das favelas modernas. Segundo o historiador, a proliferação dos cortiços na cidade do Rio de Janeiro se deu a partir das décadas de 1850 e 1860 e esteve ligada ao aumento do fluxo de imigrantes portugueses e ao crescimento do número de escravos libertos.
Os antigos cortiços eram considerados pela população e pelos jornais da época verdadeiros antros de ladrões e desordeiros, semelhante ao estigma social que ainda recai sobre as favelas contemporâneas, as quais estão corriqueiramente nos noticiários e frequentemente envolvidas na guerra urbana entre o Estado e o crime organizado.
O desmantelamento dos cortiços está inserido em um contexto político conhecido no Brasil como “higienismo” e era conduzido pelas novas tendências europeias que surgiram no período chamado de “belle époque”; assim, a busca pela limpeza dos centros urbanos visando ao melhoramento do saneamento básico e à redução das doenças relacionadas à sujeira resultou no desmantelamento dos cortiços e posterior marginalização da população nos morros cobertos pela vegetação que cercam a cidade do Rio de janeiro, conhecidos como favelas.
As atuais favelas do Brasil são habitadas em sua maioria por pessoas negras e de baixa renda, mantendo algumas tristes semelhanças com os antigos cortiços, que também eram majoritariamente habitados por pessoas negras, recém-libertas do julgo da escravidão e marginalizadas pela sociedade da sua época.
Segundo o IBGE, 67% da população das favelas são pessoas que se identificam como negras. Isso é reflexo direto da herança das desigualdades construídas pela escravidão no Brasil.
Mesmo marginalizados nos centros urbanos, os moradores das favelas ainda são responsáveis por movimentar mais de R$ 119 bilhões por ano, segundo o Instituto Locomotiva, representando uma massa econômica importante do país.
Compreender as questões sociais relacionadas às favelas é parte crucial da percepção dos desafios que deverão ser enfrentados pelos Poderes Constitucionais.
Por fim, vale ressaltar que é crucial estabelecer que as favelas não são o problema, mas, sim, o desemprego, as condições de habitação, as problemáticas de acesso à água e ao saneamento básico, além da fome, que também são muito presentes nos ambientes em questão.
Texto: Gabriel Lana