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Caminhos para a saúde de todos: como o ODS 3 revela avanços e desafios no mundo e no Brasil

Da mortalidade materna e infantil à crescente carga de doenças crônicas, um novo relatório mostra por que a ONU transformou a saúde em uma prioridade global e avalia o que ainda falta para que o Brasil cumpra as metas estabelecidas para 2030 

A saúde e o bem-estar foram incluídos entre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) porque representam direitos essenciais de todas as pessoas e constituem um requisito básico para o progresso social. A Organização das Nações Unidas (ONU) destacou que milhões de indivíduos deixam de estudar, trabalhar ou superar a pobreza devido a doenças evitáveis e a barreiras no acesso aos serviços de saúde.
A Comissão Europeia reforça essa perspectiva ao afirmar que altos índices de doenças acarretam enormes custos sociais e econômicos, além de influenciar outros ODS, como erradicação da pobreza, educação, igualdade de gênero e acesso à água. Já a Organização Mundial da Saúde (OMS) estima que quase 100 milhões de pessoas são empurradas para a pobreza anualmente por gastos catastróficos em saúde e que metade da população mundial não dispõe de serviços essenciais, evidenciando a urgência da cobertura universal de saúde (CUS). 

Além disso, aproximadamente 23% das mortes globais estão associadas a fatores ambientais, como poluição, saneamento inadequado e práticas comerciais prejudiciais. Esses dados reforçam a necessidade de políticas integradas que articulem saúde, meio ambiente e economia. Ao lançarem a Agenda 2030, os países comprometeram-se a reduzir desigualdades, ampliar o acesso a serviços e enfrentar determinantes sociais e ambientais para que ninguém seja deixado para trás.  

Os números que acenderam o alerta global 

Em meados da década de 2020, o cenário internacional apresentou avanços importantes, mas também lacunas significativas que justificaram a criação do ODS 3: Saúde e Bem-Estar. Segundo o relatório do Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU (DESA), a taxa de mortalidade materna diminuiu, mas ainda está longe da meta. Em 2015, morriam 228 mulheres a cada 100 mil bebês nascidos vivos por causas relacionadas à gestação, ao parto ou ao pós-parto. Em 2023, esse número caiu para 197 mulheres a cada 100 mil nascidos vivos. Apesar da melhoria, o ritmo de queda é lento: para alcançar a meta da ONU, 70 mortes por 100 mil até 2030, o mundo precisará evitar cerca de 700 mil mortes maternas nos próximos anos.
A mortalidade de crianças menores de cinco anos passou de 10,1 milhões em 2000 para 4,8 milhões em 2023. A taxa global de mortalidade infantil caiu para 37 por mil nascidos vivos, embora a velocidade de redução esteja diminuindo. A pandemia de COVID-19 também interrompeu campanhas de imunização, e muitas regiões ainda não recuperaram a cobertura vacinal, tornando difícil o alcance da meta de 90% até 2030.
As doenças infecciosas continuam a representar um grande desafio. Em 2023, 39,9 milhões de pessoas viviam com HIV, sendo 9,3 milhões sem tratamento; as mortes relacionadas à AIDS, entretanto, caíram pela metade desde 2010. As notificações de tuberculose chegaram a 8,2 milhões, o maior número já registrado. Quanto à malária, embora 44 países tenham sido certificados como livres da doença até 2024, a incidência global voltou a crescer após a suspensão de programas durante a pandemia. 

Como os países estão enfrentando o desafio  

Cumprir o ODS 3 envolve muito mais do que reduzir taxas de mortalidade: exige sistemas de saúde resilientes e políticas que enfrentem determinantes sociais e ambientais. A ONU enfatiza que a cobertura universal, o fortalecimento da atenção primária e a integração com outras agendas, como educação, saneamento e redução das desigualdades, são fundamentais. O Departamento de Assuntos Econômicos e Sociais da ONU (DESA) aponta que a proporção de partos assistidos por profissionais qualificados aumentou de 80% em 2015 para 87% em 2024; ainda assim, 17 milhões de nascimentos continuam ocorrendo sem assistência, especialmente na África.
Outra preocupação é a escassez global de profissionais de saúde, que pode chegar a 11,1 milhões até 2030, sobretudo em países de baixa renda. Os países que investem no setor colhem benefícios como redução da pobreza e aumento da produtividade, já que populações saudáveis impulsionam o desenvolvimento sustentável. 

Diversas iniciativas ilustram os avanços obtidos: 133 países já alcançaram a meta de mortalidade infantil, e 125 atingiram a meta de mortalidade neonatal. Organizações como a Organização Mundial da Saúde (OMS) e o Programa Conjunto da ONU sobre HIV/AIDS apoiam ações de testagem, tratamento e educação sexual. Ao mesmo tempo, a OMS alerta que a recuperação pós-COVID exige retomar campanhas de vacinação, combater a desinformação e ampliar o financiamento público em saúde. Embora o investimento internacional em pesquisa e assistência tenha crescido, ele ainda está aquém das necessidades globais. 

O retrato brasileiro  

O Brasil é signatário da Agenda 2030 e, com o seu sistema de saúde universal, o Sistema Único de Saúde (SUS), criado em 1988, oferece atenção primária, vacinação e tratamentos gratuitos a mais de 200 milhões de pessoas. Assim, o SUS contribuiu significativamente para a redução da mortalidade materna e infantil: a proporção de partos assistidos por profissionais qualificados é elevada, e os índices de mortalidade neonatal e na infância aproximam-se das metas dos ODS. Projetos de telemedicina e unidades móveis também ampliam o acesso em áreas rurais e territórios indígenas.
Apesar desses avanços, o país ainda enfrenta desafios expressivos. Um estudo de 2025, que analisou 40 indicadores do ODS 3 no Brasil, concluiu que apenas 5 (12,5%) têm chance de ser atingidos até 2030. Entre os indicadores com resultados mais promissores estão a proporção de partos assistidos por profissionais, a mortalidade de crianças menores de cinco anos, a mortalidade neonatal, a taxa de mortes no trânsito e a incidência de hepatite B. Já os indicadores referentes a mortes por doenças cardiovasculares, câncer, diabetes e doenças respiratórias crônicas mostram redução, mas permanecem distantes das metas.  

O mesmo estudo destaca a queda preocupante da cobertura vacinal para difteria, tétano, coqueluche e segunda dose de sarampo, que atingiu apenas 64%. Um grupo da sociedade civil que acompanha a Agenda 2030 classificou 12 das 13 metas de saúde como estagnadas, em risco ou em retrocesso, recomendando ampliar o financiamento do SUS, fortalecer políticas de enfrentamento das doenças crônicas não transmissíveis, expandir a atenção em saúde mental e intensificar campanhas contra a desinformação.
A boa saúde sustenta todos os demais objetivos de desenvolvimento. A ONU instituiu o ODS 3 porque reconheceu que doenças evitáveis e sistemas frágeis perpetuam a pobreza, a desigualdade e a exclusão social. Embora os dados globais mostrem avanços expressivos, eles também revelam que mulheres continuam morrendo no parto, crianças ainda sucumbem a doenças preveníveis e milhões convivem com HIV, tuberculose e outras enfermidades graves.  

No Brasil, apesar de um sistema universal robusto e de políticas bem-sucedidas, apenas uma parcela reduzida dos indicadores apresenta trajetória compatível com as metas de 2030. Superar esses desafios exigirá compromisso político, maior financiamento público, fortalecimento da atenção primária e políticas intersetoriais que promovam ambientes saudáveis e equidade. 

 

Texto: Arnaldo F. Vieira – Ascom Subseção/SP
Revisão: Tamires Lopes – Ascom FRB  

Crédito da imagem: Freepik 

 

 

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