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Após a COP30: Amazônia entra em novo ciclo de promessas para transformar compromissos em resultados concretos

Acordo para quadruplicar o uso global de combustíveis sustentáveis até 2035 ganhou força com apoio de dezenas de países, enquanto compromissos firmes de abandono dos fósseis foram vetadosevidenciando divergências profundas sobre o rumo da descarbonização

A COP30, realizada em Belém entre 10 e 21 de novembro de 2025, trouxe à tona mais uma vez o dilema central da transição energética global: seguir com um roteiro de abandono dos combustíveis fósseis ou adotar uma via intermediária alicerçada em biocombustíveis e combustíveis sustentáveis. Em meio ao impasse diplomático, emergiu a iniciativa denominada Belém 4X, uma aposta ambiciosa (e controversa) de multiplicar por quatro o uso de combustíveis sustentáveis até 2035. 

Belém 4X, formalmente apresentado já na etapa da pré-COP, buscou ampliar rapidamente a oferta e o consumo de biocombustíveis líquidos, biogás, hidrogênio de baixas emissões e combustíveis sintéticos. A proposta baseou-se no relatório da Agência Internacional de Energia (AIE), Delivering Sustainable Fuels – Pathways to 2035, e no estudo do Instituto Interamericano de Cooperação para a Agricultura (IICA) junto com a Coalizão PanAmericana de Biocombustíveis (CPBIO), que defende que a duplicação da produção de biocombustíveis líquidos até 2035 já seria viável sem ampliar a fronteira agrícola, apenas fechando brechas de produtividade. Na prática, o pacto propõe que os países signatários incorporem metas de combustíveis sustentáveis em suas políticas nacionais, harmonizem padrões de carbono e mobilizem financiamento e transferência tecnológica para viabilizar a substituição gradual da gasolina e do diesel tradicional, especialmente em setores difíceis de eletrificar, como transporte pesado, aviação e navegação.  

Durante a COP30, ao menos 25 países aderiram ao Belém 4X, entre eles Brasil, Itália, Japão, Canadá, Índia, México, países da África e da Ásia, embora a União Europeia tenha optado por não assinar o compromisso. No discurso de países líderes como Itália e Brasil, a neutralidade tecnológica foi apontada como fator essencial para ampliar a base de apoio político e viabilizar uma transição compatível com as realidades econômicas e sociais diversas. Nosso país, tradicional potência em etanol e biocombustíveis, assumiu papel central no acordo. Para o governo, o Belém 4X representa uma oportunidade de consolidar o agronegócio sustentável, expandir exportações de bioenergia e posicionar o país como protagonista da transição energética global.  

As associações do setor de biodiesel reforçaram o compromisso com metas mais ambiciosas, alegando que o país já conta com infraestrutura e capacidade de produção que poderiam elevar o teor de biodiesel no diesel nacional de 15% para 22%, sem necessidade de grandes investimentos adicionais em plantas. Apesar do impulso, a adoção de uma trajetória clara de abandono dos combustíveis fósseis, defendida por países europeus, ilhas vulneráveis e organizações ambientais, encontrou forte resistência. Países produtores de petróleo, exportadores de energia fóssil e grandes economias com uso intensivo de gás ou carvão vetaram a inclusão de menção explícita ao fim dos fósseis no texto final da COP30. O resultado foi um acordo de compromisso mínimo, com ambições reduzidas, deixando a transição como um caminho voluntário, dependente de próximas negociações. 

Em paralelo, a conferência concentrou esforços em mitigar emissões de gases de efeito estufa de curto prazo, especialmente o metano. Através de compromissos no âmbito do Global Methane Pledge e iniciativas de monitoramento e financiamento promovidas por organizações como Global Methane Hub, foram anunciados investimentos e tecnologias de controle de vazamentos, que podem trazer resultados rápidos enquanto a transição energética mais ampla não se consolida. Esse duplo movimento, o Belém 4X e a busca por cortes rápidos de metano, sintetiza a ambivalência da COP30: ao mesmo tempo em que se reconhece a urgência da crise climática e se busca inovar com biocombustíveis e combustíveis limpos, resta incerta a disposição coletiva de abandonar de fato a era dos combustíveis fósseis. A transição proposta parece depender mais da convergência de interesses políticos, econômicos e de mercado do que de um consenso climático unânime. 

Para o Brasil, o desafio será grande: transformar o compromisso em políticas públicas concretas, compatíveis com medidas de conservação ambiental, segurança alimentar e justiça social, minimizando riscos de desmatamento, expansão de monoculturas e impactos negativos para povos tradicionais. Do ponto de vista global, o Belém 4X foi um teste importante da capacidade de conciliar neutralidade tecnológica com ambição climática e do real poder de combustíveis sustentáveis como vetor de descarbonização. 

 

Texto: Arnaldo F. Vieira – Ascom Subseção/SP 

Crédito da imagemBruno Peres / Agência Brasil 

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