Entenda mais sobre as origens do voto e da justiça eleitoral no Brasil
O sistema eleitoral brasileiro tem suas raízes no período colonial, quando as primeiras eleições municipais foram realizadas em 1532, em São Vicente, na Capitania de São Paulo. No entanto, o sistema político e eleitoral do Brasil só começou a se consolidar de maneira mais organizada após a independência do país, em 1822, e a criação da primeira Constituição, em 1824, durante o Império. Nesse período, as eleições seguiam um modelo censitário, ou seja, apenas homens com determinado nível de renda podiam votar, o que restringia a participação política da maioria da população.
Os primeiros passos do sistema eleitoral brasileiro
A criação do sistema eleitoral brasileiro deve muito ao processo de construção das instituições republicanas. Com a Proclamação da República, em 1889, e a promulgação da Constituição de 1891, o Brasil adotou o sufrágio direto para a escolha de cargos do Poder Legislativo e do Executivo. Embora o voto ainda fosse restrito aos homens alfabetizados e não houvesse qualquer regulamentação eleitoral consolidada, a República trouxe o ideal de um sistema democrático representativo.
Nos primeiros anos do regime republicano, o sistema eleitoral brasileiro foi marcado por fraudes e manipulações, principalmente pelo chamado “voto de cabresto”, controlado por coronéis e oligarquias locais. Essa prática, especialmente no início do século XX, minava a legitimidade do processo eleitoral. Entre os idealizadores de reformas para conter esses problemas, destaca-se Rui Barbosa, que defendia a necessidade de um sistema mais justo e representativo. Embora suas propostas não tenham sido completamente implementadas durante sua atuação, ele lançou as bases para uma reflexão mais profunda sobre a importância de regulamentar o processo eleitoral.
O surgimento da Justiça Eleitoral
Foi durante o governo de Getúlio Vargas, após a Revolução de 1930, que a Justiça Eleitoral finalmente foi criada como uma forma de garantir a lisura e a legitimidade das eleições. Naquele período, o cenário político brasileiro era marcado por grande instabilidade. Os antigos mecanismos de controle eleitoral das oligarquias regionais estavam em crise, enquanto a insatisfação da população com as fraudes eleitorais crescia cada vez mais.
Em 1932, o Código Eleitoral foi instituído, marcando um grande avanço na história política do país. Esse código, pioneiro na América Latina, trouxe inovações importantes, como a criação da Justiça Eleitoral, o voto secreto e a introdução do voto feminino, uma conquista histórica para as mulheres brasileiras. A Justiça Eleitoral foi criada com o objetivo de organizar, fiscalizar e garantir a transparência das eleições, retirando o processo eleitoral das mãos dos grupos de poder locais e estabelecendo um sistema nacional de controle.
O Tribunal Superior Eleitoral (TSE), principal órgão da Justiça Eleitoral, foi oficialmente constituído em 1932. A partir de então, o TSE, junto com os Tribunais Regionais Eleitorais (TREs), assumiu a responsabilidade de organizar e supervisionar todo o processo eleitoral, da inscrição de eleitores à apuração dos votos.
A justiça eleitoral no sistema político brasileiro
Diversos autores analisaram o papel da Justiça Eleitoral no sistema político brasileiro. O jurista Hely Lopes Meirelles, um dos maiores especialistas em Direito Administrativo, destacou a importância do tema como garantidora da lisura do processo eleitoral, prevenindo fraudes e assegurando a legitimidade do exercício da soberania popular. Para Meirelles, a Justiça Eleitoral representa a “garantia da expressão da vontade popular”, sendo um dos principais pilares da consolidação da democracia no Brasil.
Outro autor importante, o cientista político José Murilo de Carvalho, analisa como a criação da Justiça Eleitoral foi fundamental para a modernização política do Brasil. Em seus estudos, ele aponta que, com a estruturação da Justiça Eleitoral, o Brasil passou a ter um sistema menos vulnerável às fraudes eleitorais tradicionais, o que foi essencial para a credibilidade do processo democrático. Carvalho também ressalta que o surgimento dessa justiça especializada ajudou a criar uma cultura de respeito ao voto e às regras eleitorais.
Em sua obra “Coronelismo, Enxada e Voto”, o sociólogo Victor Nunes Leal descreve como o processo eleitoral brasileiro, especialmente nas regiões rurais do país, foi por muito tempo controlado pelas elites locais. Segundo Leal, a criação da Justiça Eleitoral foi um passo essencial para romper com esse domínio oligárquico e garantir que as eleições refletissem de fato a vontade popular, sem interferências diretas dos coronéis.
O legado e o futuro do sistema eleitoral
Desde sua criação, a Justiça Eleitoral tem sido fundamental para a consolidação da democracia no Brasil. As eleições tornaram-se mais transparentes, garantindo que o resultado reflita, de fato, a vontade da maioria. Em 1996, com a introdução da urna eletrônica, o país se tornou um dos pioneiros no uso de tecnologia no processo de votação, reduzindo ainda mais as fraudes e agilizando a apuração dos votos.
No cenário político atual, o sistema eleitoral brasileiro continua a evoluir, buscando aprimorar mecanismos de inclusão, transparência e fiscalização. A Justiça Eleitoral permanece como uma instituição essencial para o funcionamento da democracia, garantindo que os cidadãos possam exercer o direito ao voto com segurança e que os representantes eleitos sejam, de fato, os escolhidos pela maioria da população.
Dessa forma, a trajetória do Brasil na construção de um modelo eleitoral justo e confiável reflete avanços significativos na democracia. A busca contínua por um processo transparente e acessível reforça a solidez das instituições e fortalece a confiança da sociedade na legitimidade das eleições.
Texto: Arnaldo F. Vieira – Ascom Subseção/SP
Revisão: Tamires Lopes – Ascom FRB
Imagem: TRE/PI